A lenda da rasga-mortalha
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Ilustração: Kalígia Siqueira. Pra cego ver: coruja branca com algumas penas alaranjadas, sobre estaca de madeira. Ao fundo, de encontro ao seu corpo, uma grande lua cheia amarelada. |
Por Carlos Rodrigo
Conhecida no Brasil inteiro, a lenda é também muito famosa no Cariri, provavelmente a mais popular entre as mapeadas pelo caça-fantasmas – não à toa sua imagem faz parte da nossa marca. Entre os moradores que eu conversei sobre lendas urbanas no Cariri, a coruja agourenta foi praticamente unanimidade de sim’s para você “você já ouviu falar?”.
Conhecida no Brasil inteiro, a lenda é também muito famosa no Cariri, provavelmente a mais popular entre as mapeadas pelo caça-fantasmas – não à toa sua imagem faz parte da nossa marca. Entre os moradores que eu conversei sobre lendas urbanas no Cariri, a coruja agourenta foi praticamente unanimidade de sim’s para você “você já ouviu falar?”.
É primordial esclarecer que, embora conhecida no singular, não é de fato a rasga-mortalha, são as rasga-mortalhas. Não é como se existisse uma única coruja imortal com o desígnio, mas toda uma espécie causadora do assombro. “Tyto Alba” é o nome científico da espécie que carrega a lenda. No Brasil, ela também é conhecida como suindara, coruja-das-torres, coruja de igreja, e, evidentemente, rasga-mortalha, habitando boa parte das américas. Entre os entrevistados pelo caça-fantasmas, a jovem Evelem Galeno, estudante universitária, nascida em berço de descendente de indígenas, disse haver casos de falecimentos na sua família após passagem do pássaro, como o do seu tio, que ao ouvir a coruja numa noite, amanheceu morto no dia seguinte. Evelem reconhece como rasga-mortalha também a coruja-buraqueira (nome científico: cunicularia), que habita todo o Brasil, com exceção da bacia Amazônica.
Os relatos variam, mas convergem em um ponto principal: a ave que traz um mal presságio através da emissão de um som estranho ao voar sobre a casa de qualquer pessoa, rico, pobre, feio, bonito. Esse mal presságio se refere a morte - ou de algo muito ruim, como doença - de algum morador da casa, ou alguém do círculo de convívio, sem se saber quando, como, e o porquê. Uns disseram que o som emitido seria um piado similar a um grito agudo de horror, outros de um tecido rasgando, vindo de suas penas ao bater asas para voar. Como disse Sandra Alvino, professora de história, o próprio nome já diz, a mortalha é o manto que envolve o morto, então ela rasga a mortalha para chamar a atenção para a morte de alguém.
Eu, que nasci e moro em Crato, Ceará, não me lembro de ter ouvido algo parecido, talvez por ter sono pesado a noite, mas depois da investigação e entrevistados alegarem piamente já ter ouvido algumas vezes e de fato ter acontecido coisas ruins, provavelmente terei no mínimo um arrepio na espinha quando ouvir a terrível rasga-mortalha. Misericórdia!
Sobre a origem da crendice, no site chamado “No Amazonas é assim”, que se refere a rasga-mortalha como deste modo conhecida no norte e nordeste, encontramos uma antiga história lendária. A publicação do site diz que uma jovem de 35 anos chamada Suindara, carpindeira (profissão em que mulheres de mais de 30 anos são pagas para chorar em velórios), filha de feiticeiro, vivia uma paixão recíproca com o filho da condessa. Suindara era um pouco gorda e de pele muito clara. Os moradores gostavam dela e a chamavam carinhosamente de Coruja Branca. A condessa, entretanto, preconceituosa, não gostou de descobrir o romance com seu filho. Mandou matarem Suindara. O povo ficou triste com a morte e esculpiram uma coruja branca para colocar sobre sua cripta como homenagem. Quando o pai feiticeiro descobriu a responsável pelo assassinato, lançou sua magia no espírito da filha, transportando-a para a estátua da coruja, a qual ganhou vida e possibilitou a vingança.